Teologia como uma reflexão a posteirore da revelação

Rimberg Tavares
3 min readOct 25, 2022

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Transfiguração de Cristo (1605). Peter Paul Rubens (1577–1640).

Por Rimberg Tavares

Alister McGrath propõe que uma teologia científica com uma abordagem realista crítica possui quatro características principais: Primeiro, ela deve ser construída como resposta a um encontro com uma realidade existente; segundo, deve ser uma disciplina a posteriori; terceiro, considera o caráter singular do objeto em estudo; e quarto, como consequência da primeira, deve fornecer uma explicação para a realidade. Quero limitar minha reflexão em apenas duas dessas características, a primeira e a segunda.

A primeira característica de uma teologia científica apontada pelo McGrath é a tentativa de trazer uma explicação adequada para a maneira como as coisas são e funcionam, tal explicação está limitada ao conhecimento humano e seu aspecto histórico. Ele baseia essa visão no projeto teológico de Karl Barth, que dá um novo significado para a teologia como uma disciplina científica que busca a objetividade da realidade, a qual é existente antes de qualquer reflexão humana. Em outras palavras, para Barth, as estruturas da realidade não podem ser criadas, mas são reveladas e entendidas através das reflexões humanas, representando essas estruturas como são (ou como tais reflexões a interpretam). Aqui podemos observar um grande contraponto com o antirrealismo criativo, o qual, conforme citado por Alvin Plantinga, influenciou a teologia por meio do pensamento de Kant, e que em sua forma pós-moderna permitiu a criação de conceitos sobre Deus ao bel prazer humano. Nesse sentido, McGrath cita uma das afirmações de Don Cupitt, quando diz que Deus não é “objetivamente real” e podemos criar a realidade conforme desejamos vê-la ou a cremos.

No entanto, a teoria antirrealista não consegue lidar com questões fundamentais práticas, como por exemplo as leis da mecânica newtoniana, a lei da gravidade ou outros aspectos das ciências naturais, tais coisas existem independente de nossa concepção sobre elas, o que podemos ter de compreensão sobre elas virá em uma análise a posteriore. Podemos dizer que isso acontece de maneira similar na teologia científica. Karl Barth afirma que a teologia é uma reflexão a posteriore da revelação dada pelo próprio Deus. No capítulo 1 do evangelho escrito por João encontramos a expressão: “o Verbo se faz carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade. E vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai”. Deus se encarnou em Cristo, revelando-se de maneira pessoal para a humanidade. Não que antes da encarnação não o tivesse feito, pois o escritor aos Hebreus diz no capítulo primeiro de sua epístola: “Havendo Deus antigamente falado muitas vezes, e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, a nós falou-nos nestes últimos dias pelo Filho”. Tendo em vista essa afirmação, só podemos concluir que a prática da teologia se dá a posteriore da realidade da pessoa de Deus revelada.

Com base nisso, não é de se espantar a afirmação do McGrath de que uma teologia científica deve ser cristocêntrica. Toda prática teológica deve possuir esse pressuposto como base: Cristo é o centro da revelação de Deus. Por meio dEle alcançamos a redenção, conhecemos a Deus, somos um com Ele e alcançamos uma visão clara do propósito da vida e da criação.

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Ensaio (editado) elaborado em maio/2021 para o Curso de Pós-graduação Deus, o Cosmos e a Humanidade da Academia ABC2 — Disciplina Cosmovisão Cristã e Teologia Natural, ministrada pelo professor Guilherme de Carvalho.

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Rimberg Tavares

Engenheiro. Especialista em Ciências Contemporâneas e Teologia Cristã.